O que seria da vida dos moradores dos prédios sem os bem intencionados e dedicados porteiros.
Homens simples, que na maioria das vezes sabem tudo de esportes, cultura, política, religião, metereologia, história geral, do Brasil, do bairro, da rua e do morador. Alguns sabem apenas o último assunto.
Mas longe de ser uma coisa negativa, a dedicação ao morador é um zelo louvável.
O porteiro do meu prédio, um coroa gente boa que tem seu próprio dialeto, é um bom exemplo de ser humano cheio daquelas boas intenções do ditado.
Para provar que é homem dedicado, que não está desperdiçando o dinheiro do morador, ele acorda 5 horas da manhã diariamente, batendo portas, deixando coisas barulhentas caírem e arrastando os passos por onde quer que vá.
Trazendo um pouco de cultura e fé aos moradores, ele assovia sempre que pode "Asa Branca", exceto quando está ouvindo no último volume um radinho numa estação evangélica.
Ele pensa na segurança do prédio quando abre a porta do elevador pra ver quem está dentro, mesmo sabendo que o elevador leva quase um século para fechar a porta de novo, isso quando não cisma de conversar com quem está dentro, mostrando assim a sua simpatia.
Zelando pela minha imagem e reputação, me conta, sem eu perguntar, quem entrou ou saiu da minha casa na minha ausência, desde a minha sogra até entregadores do petshop, supermercados, locadoras de vídeos... inclusive a hora.
Quando quer saber pra onde eu vou quando estou saindo, ou de onde estou vindo, faz por preocupação quase materna, afinal, o mundo anda muito violento...
Sua solidariedade comove a todos, exceto a síndica que mandou arrancar os pés de feijão que ele plantou no jardim, entendendo que alimentação é mais importante do que a inutilidade do paisagismo.
Seguindo à risca a máxima "pra que deixar para depois o que se pode fazer agora", ele acorda a gente pela manhã tocando a campainha impacientemente para entregar correspondências que podem ser entregues a qualquer hora do dia.
Com tantas tarefas para um ser humano fazer durante o dia, fica fácil entender os recados deturpados que ele dá, como o dia que ele garantiu que não faltaria água, contrariando uma semana de avisos colados nas paredes do prédio, e que terminou por minha mulher e filha ficarem cheias de espuma na cabeça dentro do box e sem água para se enxaguarem no banho.
Reparei que, apesar do grande coração que ele possui, ninguém o cumprimentava com aperto de mão e passei a fazer isso.
Porém, o gesto ficou banal depois de se repetir sempre que nos víamos, às vezes com pequenos intervalos de ir e voltar na padaria ou coisa parecida. Entretanto, não foi por isso que o cumprimento se extinguiu, mas depois de ocorrer imediatamente depois de limpar o suor da testa ou assoar o nariz.
Apesar de tudo, se ele fosse o porteiro perfeito - se é que existe - sentiria falta das suas trapalhadas, o prédio seria mais triste e eu não teria ninguém pra dizer quem esteve na minha casa na minha ausência.
Um comentário:
hahahaha!!! Muito bom, só muda de endereço!
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